quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Encontro o Teatro e a Rua - Galpão - MG






Neste dia 21/08, era um dia de pré-produção e estávamos mais livres, eu sabia que haveria um encontro de teatro de rua no Galpão, convidei o pessoal e lá fomos nós...engraçado que chegando lá de cara vimos o Harley, que trabalha com os Pavanelli, já estávamos em casa...Haviam alguns grupos de BH, o Miolo de SP, um grupo de Curitiba e o TNR devidamente representado por Aldo, Pimpolho, Chico, Fernanda, Herculano e eu, é claro!!!
Foi muito importante para nós estarmos presente no encontro, uma pena não poder acompanhar os espetáculos dos grupos que, iniciariam as apresentações no dia seguinte. Abaixo segue o relato do encontro, vale muito a pena ler, as opiniões dos convidados são muito interessantes e instigantes...mas antes de começar o relato, avisem para o Amir que o Chico Pelúcio mandou beijos para ele todos os dias do Itaú Cultural e neste encontro também!!!
Teatro de Rua – Galpão Cine Horto – BH – 21/08/08
Seminário “O teatro e a rua”
Provocações:
Criação e estética
Reprodutibilidade do pensamento hegemônico
Linguagem X Tecnologia X arquitetura urbana
Estética X Falta de dinheiro
Apresentação das pessoas
Mesa:
1) Cícero- Palhaço
Falar do teatro que eu faço, nasce do interior do sujeito e se configura como uma criação que vai dando seus primeiros passos e ganha o mundo sem termos muita noção do que seja.
Não sou tão romântico para dizer que faço só por amor, é meu ofício, vivo disso. Sou produtor, diretor e ator.
Fiquei pensando o que ia falar, pois não tenho muita experiência. Mas vou falar da minha própria experiência que é o que posso falar.
A idéia de criação que é a essência do nosso fazer artístico, seria a idéia de concepção, compromisso de gerar um filho, cultivo de bicho, tudo isso é criação. Um ato divino também é uma criação e obra já tem uma multiplicidade de conceito. Diversão ligada a criação, visão diferente, uma série de questões que temos que enfrentar na hora da criação. Transformar idéias em espetáculo, que deve contentar o espectador que é a pessoa fundamental do espetáculo.
A idéia de estética, fui ao dicionário, estética facial, ligada à cirurgia plástica, também percepção, sensação, estudo do belo e da natureza da arte, diferentes formas de arte e do trabalho artístico, relação entre matérias e formas, verificação do que pode também ser feio ou ridículo, aí eu me reconheci. Pensei em associar estética com linguagem, consigo identificar algumas estéticas e aspectos formais, entendo isso, mas me preocupa essa idéia de linguagem, pois a estética traz dentro do próprio conceito a ética. A ética não do conceito moral, mas a ética como conjunto de regrar que regem nossas funções, nosso grupo. Isso me motiva a pensar em ética, cm q a estética abarca isso. A idéia de compromisso está embutida na idéia de criação, o que faz de mim artista e o que tenho para dizer é a minha experiência é a minha ética.
Experiência do ir e fazer, me expor por meu feofó na roda, preciso confiar no outro.
Princípios norteadores: Relação com o público – empatia – ligada a figura do palhaço, quando boto o nariz não preciso fazer nada, o público já é generoso e me acolhe (o taxista não quer cobrar passagem, o outro quer me contar sua vida).
Transgressão é a gênese da obra de arte. Não é sair pisando em tudo, invadir lugar proibido. O poético está na experiência que cada um vivência.
Nossa montagem tem que ter uma mala pois eu mesmo levo. Sou ator, diretor e dramaturgo, quem cria, sou eu diante do público, ele me ajuda a escrever o espetáculo, depende de como ele devolve. Na rua foi difícil, estava tão exposto, e o fracasso no encontro com o público era sucessivo. Tive que desenvolver estratégias para não ficar tão exposto, criei pontos dramatúrgicos que percorro até chegar ao fim. O fenômeno artístico acontece na relação, no encontro, o teatro de rua que faço e acredito é da relação do encontro. Aprendo com o cara que vende bala na rodoviária, ele faz um teatro genuíno, é aplaudido espontaneamente, ele tem domínio de roda, cm ele constrói um texto, ele faz tudo q os teóricos falam.
Provocação: Teatro bonitinho, com cenários decorativos, funcionais e com piadas formais, previsíveis, que não tem surpresa, será que isso é demanda do patrocinador que é nosso censor muitas vezes?
A idéia de teatro como interface facilitadora de projetos de educação, do meio ambiente, saúde (ensinar criancinha a escovar dente) o teatro serve para isso? O teatro empresa, qual o valor disso?!

2) Renata – Miolo – SP
Não tenho formulação de conceitos do que é a prática de teatro de rua, vou fazer reflexões sobre a minha experiência no Miolo, que nasceu com essa vocação.
Quando começamos a fazer teatro de rua nosso primeiro impulso era fazer teatro popular, Moliere, Cordel, isso com certeza é popular. Montamos o Burguês Fidalgo com tudo que conhecíamos (inclusive nas nossas escolas), comédia dell’arte, máscaras, cordel, depois disso começamos a pensar, atuamos no centro velho de SP, as pessoas aplaudiam era legal, mas a cidade de SP, a arquitetura, as pessoas (executivo, menino que cheira cola), vimos que estávamos na superfície, não abarcava as profundidades da cidade, daquilo que víamos na rua. Começamos a discutir a questão da rua, da cidade, o que a gente queria revelar (piada, graça, roda grande?). Começamos a abrir mão de tudo, só ator, e montamos o Doente Imaginário, dava certo, tínhamos algumas fórmulas (esse aqui é SESC, aquele é prefeitura).
Depois de uma longa temporada fomos investigar a linguagem, olhar para a rua, o cheiro, as pessoas, a cor.
Trabalhamos com treinamento diário do ator.
Fizemos mais de 1000 apresentações do Doente Imaginário, foi um divisor de águas para o Miolo, o popular não era o tínhamos aprendido na escola, era outra coisa, estava muito mais ligar ao comportamento da cidade, de como o homem se organiza na sociedade, do que a uma tradição popular. Resolvemos radicalizar, pegar o olhar sobre a cidade e que fosse o nosso mote de vida, a rua revela tudo ela é criadora de sentido. A rua tem uma vida tão singular, serve para tudo, ela sintetiza o homem de hoje, é um dos poucos lugares onde as coletividades existem, estão pulsando, onde nos cruzamos. A rua revela como nós homens escolhemos viver. O transito é material para fazer arte, o que está por trás de vivermos em relações verticais, por que escolhemos viver assim? A rua te revela isso. A rua corto a veia dos artistas, começamos a conceber nossa linguagem a partir deste universo.
Largo da Memória , falava das ruas de SP, não vendia, mas sabíamos do risco, radicalizamos na questão espacial, saímos da roda, fizemos corredor, piramos,porque era isso que a cidade nos dizia, o publico gostava mas fracassou, não deu certo, mas nos foi muito especial, nos fez ir para a fronteira do ator, da cenografia, da dramaturgia, não queremos mais ficar no local conhecido, queremos estar na tentativa de um teatro que é arte, nunca vamos saber o limite, não sei mais quero ir, e a medida que você vai tem sempre mais fronteira.
A rua nos deu a possibilidade de não achar a linha da rua, é fluxo sempre, nada demarca, nada garante, o risco está sempre ali.
No grupo decidimos que temos que ter habilidades, aprender a subir em prédio, não sei se vamos fazer isso, mas queremos romper fronteiras...
Na rua não tem público domesticável, cada bêbado é um, o cachorro também, às vezes a gente não sabe o que fazer. O teatro de rua não é só lidar com bêbado, cachorro e mendigo, a rua muito nobre, é um espaço movente, me move como artista, me provoca a criar.
Não faço ciência nem política, faço estética que é arte. No grupo nos perguntamos como em 2008 em SP produzo poesia?
Como nos encontramos hoje, como produzimos um encontro estético nestas cidades que se comportam assim, com essa geração, meus alunos são muito rápidos, eu diálogo com ele, eu confronto?
3) Fernando Limoeiro
Eu vi teatro de circo e rua (manifestações – boi, cavalo marinho), não sabia que tinha teatro de palco, a celebração me chamava mais atenção, o brincante, ele estava ali para brincar, perdemos a comunhão a celebração. O teatro de rua precisa retomar a celebração. O ator tem que se preparar, as ruas são diferentes, precisamos estar atento a cada espaço.
Vi um espetáculo do Cariri, perguntei porque vocês fazem teatro de rua? Brigamos com o padre, perdemos o espaço da paróquia e só sobrou a rua, e o figurino foi feito com faixas da cidade. Sentido de levar a arte onde o povo está, de qualquer forma que seja feita é encontro e troca, coragem e risco.
Experimentar teatro popular, nos alimentar com o circo, aceitar as interferências. O que me fascina no brincante é a idéia de festa de celebração, ator é instrumento vertical.
Provocação: Não é só carnavalização, ver a pulsação do povo, sair da zona de conforto. Já que vai a rua faça um teatro que se comunique com a rua. O teatro que precisa de manual, nem quem faz mesmo entende.
O teatro de rua não tem a vocação de festa de celebração, o ator em si também não está brincando dê?! Sinto falta disso. Tudo que vi na minha infância foi circo e manifestações populares (bumba meu boi).
O artista popular não tem o purismo estético, pois quem vai ali vai se alimentar de outra coisa. O que me moveu fazer teatro: uma cena de mamulengo que batia em um cabo, quando terminou, um bêbado pagou 5 mil réis para o mamulengo repetir a cena e bater novamente no cabo, a obra serviu ao homem. O outro era cordel, o palhaço Zé Botoca, fazia o cordel e lia para os matutos. O analfabeto tem necessidade da arte como qualquer acadêmico.
Só posso escrever sobre o homem que conheço, por isso falo sobre o nordestino na metrópole.
Só acredito na dramaturgia em que o povo se vê.
Ser artista tem utilidade que transcende, meu compromisso com a arte, com a política, como ato de transformação que toda arte tem que ter, não podemos perder o ser brincante. O que me prende é a coragem e a generosidade, ele tem que ser inventivo, astucioso.
O que o artista popular de rua tem, quais suas influências?
O s pensares do teatro de rua me acrescentam, teatro não é para normal, somos inquietos, quando nos vemos juntos, dá uma força danada.
Falta muitas vezes a celebração e o contato real com a rua. O ator é um homem no espaço e ele tem que se relacionar com o espaço.
O artista de rua tem a liberdade, é um ser ousado.

Aberto o debate: (abaixo algumas anotações sobre questões apresentadas)
Linguagem que dialogo com o povo quando entro em contato com a rua, faço política também, revelo, tudo que souber e aprender na vida vai servir pra a minha arte.
Qual é o tempo de um espetáculo? O que determina é o que acontece entre mim artista e o público, é relativo ao encontro, fazemos uma escolha.
Experiência de rua é fundamental para qualquer ator, a gravidade do ator na rua é maior que o palco, o centro da terra suga, temos que lançar mão de energia, treinamento técnico e também pode contar com a arquitetura urbana, ao pensar a eficiência de uma comunicação.
Para a rua devemos ter uma linguagem direta e rápida, o tempo é mais rápido.
O que faz teatro de rua ser minoria? Ter um encontro para se falar só sobre teatro de rua? Ser específico?
Ou há comunhão ou não há, pois se não há, as pessoas vão embora.
O teatro de rua é a prova dos 9.
O Brasil não é quarto e sala com duas pessoas discutindo relação!!
O público de rua me interessa mas a rua não tem bilheteria! (Comentário de um ator de palco)
Que concessões tenho que fazer para ir para rua?
Quando você se deixa transformar pela rua, você vê que não é usando de linguagem fácil que você vai falar. Concessão é superfície, busco o encontro dos afetos. Não faço concessão, peço permissão para ir a um local onde não é o meu. (Cícero – Palhaço)
Artista popular pede licença para brincar. (Limoeiro)
Neste momento do debate entra um palhaço... e todo o discurso se presentifica e apresenta naquela figura...

Ana Cândida

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